18.3.09

Sem ler não respiro

Minhas lembranças sobre a leitura são fragmentadas. As mais antigas são dos contos da coleção Disquinho tocando na vitrola. Patinho Feio e Branca de Neve narrados por vozes empostadas tomavam conta do pequeno apartamento térreo em Ipanema - o meu preferido era A festa no céu.

Gostava de ouvir minha avó contando como era a vida dela quando criança. Queria saber como eram os lugares, o que ela fazia, todos os detalhes do dia-a-dia, a comida, o banho, o que ela lia. Lembro de um livrinho de orações com capa de madrepérola, que ficava ao lado de sua cama, gostava de folhear as páginas fininhas, quase transparentes. O objeto me interessava muito mais do que seu conteúdo.

Eu lia os textos de embalagens de todo tipo, durante o café da manhã, no banho. Cartazes na rua, out-doors.

A enciclopédia Delta Larousse ocupava um lugar acessível na estante de minha mãe. Aos 10 anos, sentava lá às tardes e ficava lendo aleatoriamente todo tipo de informação.

Minha avó havia feito encadernação, mas depois abandonou a atividade, sem explicar o motivo. No seu quarto ficavam os livros que ela havia encadernado, capas de couro e letras douradas. Ela adorava poesia. Eu tinha especial apreço por uma edição do livro de Cecília Meirelles Ou isto ou aquilo. Ilustrado por xilogravuras em papéis coloridos, tinha o formato comprido, vertical.

Passava um tempão conversando com Paulina, a cozinheira, natural de Santana do Livramento, na fronteira com o Uruguai. Aquele lugar me fascinava - a distância, os gaúchos, o mate, o frio, a névoa da manhã. Adorava quando ela me convidava para escrever as cartas para a família, era como se um pouco de mim fosse para lá.

No início da adolescência, tornei-me sócia do Círculo do Livro, um tipo de Avon da literatura adaptada para jovens, com clássicos ilustrados. Todo mês eu escolhia e encomendava um livro a um vendedor que vinha em casa. Quando chegava o livro, cada momento era um prazer. Abrir a embalagem, folhear, ver os desenhos, e só então iniciar a leitura.

Aos 12, reinvidiquei autonomia e passei a ir sozinha para a escola e pelo bairro de Copacabana, para onde nos mudamos após a separação dos meus pais. A biblioteca do bairro foi minha grande companheira nessa etapa - fazia lições, pesquisas, ficava por lá horas, fuçando as prateleiras.

Um comentário:

Maria José Nóbrega disse...

Isabel,
que belo texto!
Também fui, por algum tempo, sócia do Círculo do Livro. Lembro-me de um episódio bem divertido com um dos vendedores não muito bem informado a respeito das mercadorias.
Entregava o pedido para adquirir uma edição facsimilada da "Revista de Antropofagia", quando ele acrescenta o comentário: esse livro é muito bom para quem gosta de biologia!
Se não combina pelo menos rima, não é?
Beijos,
Mazé