10.5.09

Comentário sobre "A morte do autor"


Que voz é essa que fala ao leitor em um texto ficcional? Considerando que uma obra literária tem sua origem na figura do autor, a resposta de Barthes surpreende: a escritura é a destruição de toda voz, de toda origem de um texto.
O semioticista francês nos mostra que o autor se desfaz na tessitura textual. Quem fala é a própria linguagem. Considerando-se que a linguagem é um todo múltiplo, constituído de enunciados de tantas origens, de tantas enunciações, que não são mais que citações, o autor deixa de ser o criador de um texto original. Buscar um sentido final para o texto não é mais, portanto, uma necessidade. "O espaço da escritura deve ser percorrido, e não penetrado" (BARTHES, 1988/2004, p.63), pois o sentido não tem fim.
O exemplo da ambiguidade constitutiva da tragédia grega, revelada pelos estudos de Vernant, é uma belíssima ilustração, que nos mostra que o decifrador da multiplicidade de sentidos, desse "perpétuo mal-entendido" (BARTHES, 1988/2004, p. 64), onde se dão encontros e embates, é o leitor.
Até aqui tudo bem. Percorrer o enunciado do autor é também trilhar os enunciados que o constituem, e que revelam o autor escondido, diluído na linguagem. Informações sobre o contexto de produção, sobre o passado e ideologia do autor são dados enriquecedores, mas não são condicionantes para a compreensão do texto acontecer. Mas não ficou claro quando Barthes diz que o leitor abarca toda a multiplicidade, sem que nada se perca, que reúne todos os traços de que é constituído o texto. Para mim, o leitor não é um ser totalizante, mas fragmentado, sua visão é virtualmente completa, mas a realização é fragmentada. O todo nunca é apreendido até porque o sentido não se esgota a cada leitura. Parece-me que esse estranhamento pode ser devido ao fato de o estruturalismo tentar descobrir elementos gerais. Barthes quer descobrir o Autor e o Leitor, seres genéricos, que representem o conjunto de individualidades. No entanto, a literatura é formada pelas especificidades que ocorrem tanto na produção, pelo autor, como na recepção, pelo leitor.

4 comentários:

Maria José Nóbrega disse...

Isabel,
que belíssima polêmica você instalou em seu comentário: pano para muitas reflexões.
Beijos,
Mazé

cibely disse...

Adorei seu comentário! Você escreve muito bem!!!

Beijo
Cibely

cibly disse...

Parabéns pelo comentário! Você escreve muito bem!
Adorei!
Um beijo
Cibely

Márcia Fortunato disse...

Isabel, que comentário bom você fez! Gostei muito, ainda mais porque você tem um texto claro, fluente e principalmente porque institui o diálogo com o texto de Barthes, reconhecendo devidamente as autorias.
Acho que temos aí muito material para novas reflexões.
Beijo, Márcia.